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BRF, Nestlé, Unilever, Burger King e McDonald’s estão de olho no mercado vegano.

Assunto vira capa da IstoÉ. Entenda por que devemos apoiar.

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Quando nos tornamos veganos e, inevitavelmente, passamos a viver dentro de uma pequena bolha do Movimento de Direitos dos Animais, em geral acabamos exaltando nossos princípios morais e nos afastando de estratégias pragmáticas que, muitas vezes, podem ferir os princípios e valores que desejaríamos que a sociedade tivesse em um mundo ideal.

Isso não ocorre por acaso. Quando tomamos conhecimento de toda a brutalidade e covardia que a indústria alimentícia impõe a bilhões de animais indefesos todos os anos, acabamos, muitas vezes, tornando-nos irredutíveis e intolerantes ao jamais aceitar qualquer coisa que seja diferente da libertação animal imediata.

Acontece que, quer queira, quer não, a sociedade moderna é composta por três pilares fundamentais: 1) Pessoas, 2) Empresas e Instituições e 3) Governo. Poderíamos desejar outra estrutura, mas é nessa em que vivemos hoje. Se quisermos, muito além de ideologia, acabar efetivamente com a exploração animal, precisamos atuar nesses três pilares, que são absolutamente interdependentes. A atuação em um afeta os outros dois, direta ou indiretamente. O Brasil não será um país vegano se pessoas, empresas e leis não mudarem. Todos os três pilares dependem de atuação e mudança para o avanço do Movimento de Direitos dos Animais.

Quando vemos uma empresa que financia exploração animal a reação mais fácil e natural é a colocarmos em uma posição de inimiga ou oposta. Contudo, se entendermos que a empresa precisa mudar para avançarmos rumo ao fim da exploração animal, devemos mudar esse ponto de vista e enxergá-la como uma oportunidade para a nossa causa. O mesmo se aplica a pessoas que ainda não são veganas. Se ativistas as consideram como opostas ou inimigas, acabamos criando um clube vegano e um abismo cada vez maior entre veganos e não-veganos. Ao invés de abismos e aumento de distâncias, precisamos construir pontes: facilitando, agregando e encorajando positivamente a mudança dos outros, independente de suas motivações primárias.

Para promovermos avanços palpáveis e significativos pelo fim da exploração animal, independente dos princípios morais que tenhamos como premissas em nosso posicionamento ético como veganos, é preciso examinarmos as situações de forma serena e pragmática, e considerarmos pessoas não-veganas, grandes empresas e governos (e leis) como potenciais aliados, jamais como inimigos.

Nesta semana, a IstoÉ Dinheiro estampou na sua capa o movimento que grandes empresas alimentícias tradicionais estão fazendo ao lançarem novos produtos veganos e ovo-lacto vegetarianos em larga escala no mercado. Apresento a seguir alguns benefícios de alto impacto que são consequências diretas desse movimento das grandes empresas:

  • Quanto mais opções existirem, mais fácil será a transição de hábitos alimentares em larga escala.
    Veganos sabem que ser vegano não é difícil, mas a maioria das pessoas que não é vegana não tem essa percepção. Se queremos ajudar a promover a mudança de hábitos em outras pessoas é preciso pensar com a cabeça delas e em estratégias para elas, não em estratégias que façam sentido para veganos ou que se adequem aos princípios morais fundamentais que alguns ativistas buscam estabelecer. 


    Acima, um gráfico em formato de gangorra que descreve a relação entre dificuldade e adesão. Quanto mais fácil for a transição (ou pelo menos a percepção dessa facilidade), mais pessoas mudarão seus hábitos, mesmo que de forma gradativa.

  • Preços mais baixos e acessíveis e produtos disponíveis em todo o país
    Grandes empresas produzem em larga escala e, portanto, possuem poder de preço. Quanto maior a produção, mais barato o produto tende a custar.
    Essas empresas também possuem grande poder de logística, o que significa que, diferentemente da maioria das pequenas empresas, seus produtos podem estar disponíveis em milhares de cidades em todos os estados brasileiros, aumentando consideravelmente a acessibilidade desses produtos. Segundo o Ibope Inteligência, “55% das pessoas consumiria mais produtos veganos se os ingredientes estivessem indicados na embalagem. E 60% escolheria um item vegano se este tivesse o mesmo preço do produto que costumam consumir.”
  • O aumento da concorrência de produtos veganos estimula o aumento da qualidade desses produtos e a diminuição do preço no ponto de venda
    A consequência natural disso é uma maior adesão de uma maior quantidade maior de pessoas a esses produtos, ao invés de produtos de origem animal.

  • Quanto mais oferta proporcional de produtos veganos, menor a oferta proporcional de produtos não-veganos
    Uma comparação mais simples: suponhamos que, hoje, a população brasileira consuma, no total, 9% de carne e 1% de vegetais. Se as grandes empresas produtoras de alimento no Brasil começarem a mudar a oferta para equilibrar essa balança, gradativamente a tendência é que o consumo total seja: 5% de carne e 5% de vegetais, mesmo que a população brasileira ainda não seja 50% vegana. 

    Produtos veganos de empresas não-veganas não necessariamente destinam-se a veganos. Nos Estados Unidos, grandes empresas de produtos veganos estimam que 70% de seus consumidores sejam não-veganos.

  • Efeito dominó
    O lançamento de produtos veganos no mercado (ou ao menos ovo-lacto vegetarianos) por parte das maiores empresas alimentícias do país tem potencial para causar um efeito dominó. Elas são as que mais acompanham tendências de mercado e as que mais moldam o perfil de consumo da população. Milhares de outras empresas menores seguirão esse comportamento, e o impacto direto nos animais será potencializado.

  • Pesquisa indica que fatores como conveniênciapreço e sabor são determinantes para mudanças de hábitos alimentares
    Uma pesquisa recente realizada pelo The Good Food Institute Brasil evidenciou a importância desses três fatores na disseminação do consumo de alternativas vegetais à proteína animal. O crescimento do veganismo nos últimos anos tem fortes relações com o investimento bilionário no desenvolvimento de novos produtos.

Se grandes empresas lançarem produtos veganos, não movidas por questões éticas, mas apenas visando lucro, então que lucrem muito com a venda de produtos à base de beterraba, cenoura e soja.

Como disse Tobias Leenaert sobre opções veganas no McDonald’s: “o julgamento de uma ação é parcialmente inspirado por como enxergamos as intenções ou motivações das pessoas por trás de cada ação. É absolutamente seguro  afirmar que a motivação por trás do lançamento do McVegan é financeira. Muitos dos comentários no post do Facebook são exatamente sobre isso: o McDonald’s está fazendo isso apenas pelo dinheiro; eles são mercenários etc. Buscar lucro é normal para uma empresa. Ainda assim, muitos de nós não gostam dessa motivação por exigirmos motivações éticas.

A pergunta é: o quão importante são as intenções? Os animais certamente não ligam.’’

Fonte: www.veganismoestrategico.com.br

Sobre Lucas Alvarenga

Formado em comunicação. Ativista pelos direitos animais focado em impacto. Em 2015, criou o Desafio 21 Dias Sem Carne em parceria com a SVB e idealizou o Festival Veggo, o primeiro grande festival vegano no estado do Rio de Janeiro. Também em 2015, foi responsável pela vinda da ONG Mercy For Animals para o Brasil. Gerenciou a criação e o desenvolvimento do departamento de Comunicação durante cinco meses e assumiu a Vice Presidência da ONG no Brasil durante três anos. É Vice Presidente Internacional da Mercy For Animals responsável pela expansão do trabalho da ONG no Canadá, México, Brasil, China e Índia.
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