Skip to main content

A Ética Animal em Novos Tempos: Pragmatismo, Pluralismo e o Futuro da Educação Moral

etica animal 2
A ética animal, especialmente no contexto moderno, enfrenta desafios profundos. Na obra " Ética Animal para os Novos Tempos: Pragmatismo, Pluralismo e Educação Moral ", escrita por Carlos Naconecy, o autor propõe uma atualização urgente da ética animal. O mundo mudou, e as respostas da teoria animalista precisam acompanhar essas transformações, refletindo uma sociedade que se mostra cada vez mais insensível às questões de proteção animal. O autor, um especialista em ética da vida e ambiental, não apenas sugere uma reavaliação teórica, mas também oferece uma visão pragmática e pluralista para lidar com os desafios atuais. Aqui, desdobraremos os pontos mais importantes do trabalho de Naconecy, mantendo o otimismo de que o futuro da ética animal pode e deve ser diferente.

A Crítica à Teorização Pura: Chega de Academia por Academia

Naconecy começa com uma provocação direta: a ética animal, como é feita até agora, já não basta. Não podemos nos dar ao luxo de ficar presos a exercícios puramente acadêmicos, ele afirma, enquanto as grandes ameaças pairam sobre a vida no planeta. A citação do filósofo estoico Epicteto, de que é mais importante viver uma filosofia do que explicá-la, é central para o argumento. Em outras palavras, saber das injustiças que os animais enfrentam não é suficiente — precisamos agir.

Há uma crítica aqui ao distanciamento entre a academia e a sociedade. Embora a ética animal tenha crescido em bases teóricas nas últimas décadas, a lacuna entre o que os estudiosos discutem e o que o público em geral entende permanece significativa. O autor questiona até que ponto a teoria realmente impacta as práticas de consumo ou as políticas de proteção animal. Ele menciona o exemplo de países como Áustria e Alemanha, onde os animais, por lei, deixaram de ser considerados “coisas”, mas o consumo de carne não diminuiu. Ou seja, os direitos dos animais são reconhecidos, mas continuam a ser tratados como meras commodities.

O Pragmatismo Pluralista: Uma Nova Abordagem

Se a teorização não tem surtido os efeitos desejados, Naconecy propõe uma abordagem pragmática e pluralista para lidar com a questão animal. Ele defende que não há tempo a perder — os animais e a natureza estão correndo contra o relógio. O pragmatismo aqui não significa adotar a velha ideia de que "os fins justificam os meios", mas sim de que precisamos de ações eficazes que ressoem com o público.

O pluralismo é essencial porque, na sociedade contemporânea, as interpretações sobre os animais variam enormemente. Um único enfoque rígido não funcionará para mobilizar a sociedade. Em vez disso, é necessário explorar múltiplos caminhos e conceitos que tenham potencial de tocar diferentes segmentos da sociedade. Esse pluralismo também se traduz na pedagogia moral, onde o autor sugere a adoção da ética das virtudes como guia normativo.

O Desafio da Comunicação: Filosofia para Todos

Um dos maiores desafios para os defensores da ética animal, segundo Naconecy, é aprender a comunicar suas ideias de maneira acessível. Como ele argumenta, grande parte do público não é formado por acadêmicos ou intelectuais. Isso não significa que teorias complexas devem ser descartadas, mas que elas precisam ser traduzidas para uma linguagem compreensível e conectada à vida cotidiana.

Esse ponto fica ainda mais claro quando ele discute a necessidade de um eticista animalista aprender outras linguagens para comunicar sua causa. Naconecy cita Davis Johns, afirmando que não basta falar apenas para outros filósofos em conferências e salas de aula — se quisermos mudar o mundo, precisamos participar dos debates públicos e influenciar ativamente.

Razão vs Emoção: É Hora de Equilibrar

Um aspecto interessante do pragmatismo defendido por Naconecy é o equilíbrio entre razão e emoção. Ele critica a tendência de alguns eticistas, como Peter Singer e Tom Regan, de focarem exclusivamente na razão, deixando de lado o apelo emocional. A questão aqui é que as pessoas não são convencidas apenas por argumentos racionais — a emoção também desempenha um papel fundamental na mudança de comportamentos.

A defesa de direitos dos animais, segundo Naconecy, deve ser feita de maneira que as pessoas comuns possam se identificar. É preciso considerar a intuição moral popular, que tende a diferenciar o valor moral de diferentes espécies de animais. Um exemplo clássico é o dilema do bote salva-vidas, onde um humano e um cão disputam o último lugar. Quase todos, incluindo os próprios eticistas, recomendariam salvar o humano. Esse pragmatismo, longe de ser uma traição à causa, reflete a necessidade de uma abordagem que tenha ressonância com a sociedade.

Pluralismo Metodológico: Mais de Uma Forma de Ser Justo

Naconecy defende o pluralismo metodológico como a melhor estratégia para lidar com a ética animal. Ele critica o monismo moral, que tenta resolver todas as questões éticas com um único princípio. No mundo real, as situações são diversas e complexas demais para serem abordadas com uma única teoria.

O pluralismo permite adotar várias abordagens simultaneamente, dependendo do contexto. Isso pode incluir compaixão, direitos, vulnerabilidade, subjetividade, entre outros conceitos, todos convergindo para a proteção dos animais. Naconecy sugere que a defesa animal pode ser sustentada em diversas bases, incluindo até mesmo textos religiosos, como a Bíblia, o Corão e o Bhagavad Gita, dependendo do público que se deseja alcançar.

A Ética das Virtudes: Um Caminho Alternativo

No final da obra, Naconecy apresenta a ética das virtudes como uma alternativa poderosa para a defesa animal. Em vez de focar apenas em direitos ou deveres, essa abordagem se concentra no caráter e nas atitudes morais. A questão não é apenas o que é certo ou errado, mas que tipo de pessoa queremos ser.

Essa abordagem é especialmente útil porque não exige conhecimento técnico ou filosófico para ser compreendida. Não precisamos discutir direitos dos animais ou valor intrínseco para ensinar nossos filhos a respeitar os animais. Pequenos gestos do cotidiano — como evitar machucar uma formiga ou alimentar um cão — já são formas práticas de inculcar virtudes como compaixão e respeito pela vida.

Um Novo Capítulo para a Ética Animal

A obra de Carlos Naconecy é um chamado à ação. Ele não apenas aponta as falhas da abordagem atual da ética animal, mas também oferece soluções práticas que podem efetivamente fazer a diferença no mundo de hoje. Seu pragmatismo pluralista e o enfoque na ética das virtudes são ferramentas poderosas para transformar a maneira como pensamos e agimos em relação aos animais. Se queremos construir um futuro mais justo para todas as criaturas do planeta, a ética animal precisa abandonar as discussões puramente teóricas e se voltar para a ação prática, conectada à realidade das pessoas comuns.

No final das contas, como bem colocou Naconecy, a ética animal deve se esforçar mais para mudar o mundo do que para apenas analisá-lo. E isso é algo que todos nós, como defensores dos direitos animais, devemos levar a sério.

Por: Alex Fernandes

Fonte:  Etica Animal para os Novos Tempos Pragma

Sobre Carlos Naconency:
Carlos Naconecy é filósofo especialista em ética animal e ética da vida (ética ambiental). Possui graduação em filosofia pela UFRGS, mestrado e doutorado em filosofia pela PUCRS. Foi pesquisador visitante na Universidade de Cambridge, Inglaterra. Dentre outras publicações, é autor do livro Ética & Animais: Um Guia de Argumentação Filosófica, lançado em 2006 pela editora Edipurs

  • Criado por .
  • Acessos 36