Como a legislação brasileira evoluiu para proteger os animais e quais são os princípios éticos que fundamentam essas mudanças?
A legislação brasileira em relação à proteção animal teve um início notável com o Decreto 24.645 de 1934, que introduziu normas de proteção animal. Posteriormente, o Decreto-lei 3.688 de 1941, na Lei das Contravenções Penais, proibiu explicitamente a experimentação animal para fins didáticos quando houvesse métodos alternativos. A Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais), em seu artigo 32, § 1º, avançou significativamente ao equiparar a realização de experiências dolorosas ou cruéis em animais vivos (mesmo para fins didáticos ou científicos, na existência de recursos alternativos) a condutas delituosas passíveis de punição.
No entanto, a Lei 11.794 de 2008, que regulamenta o uso científico de animais, apesar de estabelecer procedimentos, ainda permite a experimentação. Isso contrasta com o avanço da comunidade científica brasileira, que, reconhecendo a senciência e autonomia dos animais, tem buscado a substituição de modelos in vivo por técnicas in vitro e in silico, e quando a substituição completa não é possível, a redução e o refinamento (princípio dos 3Rs: Replacement, Reduction, Refinement) do número de animais e a minimização de seu sofrimento. A Rede Nacional de Métodos Alternativos (Renama), criada em 2012, exemplifica esses esforços de promoção e validação de métodos alternativos.
A fundamentação ética por trás dessas mudanças reside no reconhecimento da senciência animal e na rejeição do antropocentrismo, que historicamente colocou os humanos em uma posição de superioridade moral incondicional. Filósofos como Tom Regan defendem que os animais são "sujeitos de uma vida", possuindo valor inerente e merecendo direitos fundamentais, independentemente de sua utilidade para os humanos. Este conceito abrange seres conscientes com uma identidade psicológica unificada e uma experiência de bem-estar. A senciência e a consciência estão implícitas no conceito de "autonomia prática", e a lei não exige autonomia plena para reconhecer direitos a humanos, o que, para Wise e Francione, deveria se estender aos animais, conferindo-lhes o direito moral básico de não serem tratados como propriedade e de serem considerados pessoas morais com interesses significativos. Peter Singer, com seu "utilitarismo de interesses", argumenta que a capacidade de sofrer e sentir dor deve ser igualmente considerada para humanos e não humanos.
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