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Por que a afirmação de que o especismo é "natural" ou uma "tradição" não o justifica?

Apelo ao Natural: A defesa de que o especismo é justificado porque é "natural" (ex: "animais comem uns aos outros", "humanos estão no topo da cadeia alimentar", "somos caçadores") falha por diversas razões:

  1. Ausência de explicação: Não se explica por que algo ser natural o torna justo.
  2. Definição ambígua de "natural": Se "natural" significa "possível", então qualquer comportamento possível seria justo, incluindo atos moralmente condenáveis. Se significa "instintivo", tendências instintivas (como a inclinação à parcialidade ou ao abuso dos vulneráveis) não tornam os comportamentos justos.
  3. Arbitrariedade na imitação da natureza: Aqueles que apelam à natureza para justificar o consumo de animais não humanos não aplicam a mesma lógica a outros comportamentos animais (roubo, estupro, infanticídio) nem rejeitam avanços tecnológicos e sociais que não são "naturais". A escolha de quais aspectos da natureza imitar é tendenciosa.
  4. Poder não implica justiça: Estar no "topo da cadeia alimentar" apenas significa ter o poder de explorar, o que não confere justificação moral. Ter poder não torna um ato justo; se uma espécie mais poderosa criasse humanos para comer, isso não seria justo.

Apelo à Tradição: A justificativa de que práticas especistas são justas por serem tradicionais também é falha:

  1. Implicação oposta: Se a tradição justificasse uma prática, então o racismo, sexismo e escravidão humana, que foram (e alguns ainda são) práticas tradicionais, também seriam justos, o que é inaceitável.
  2. Inúmeros exemplos de tradições injustas: A história está repleta de tradições brutais e injustas (sacrifícios humanos, queima de bruxas, mutilação genital feminina) que demonstram que a antiguidade de uma prática não lhe confere justiça.
  3. Tradições que causam vítimas: Mesmo que se argumente que tradições são boas porque beneficiam alguns indivíduos, é arbitrário ignorar os danos que causam a outros. O sofrimento e a morte infligidos em práticas especistas superam largamente os benefícios, e seriam rejeitados por quem não soubesse sua posição na tradição (beneficiado ou vítima). Se uma tradição é defendida como boa "em si", sem referência a benefícios, essa alegação é difícil de fundamentar e ainda mais difícil de justificar quando envolve grande sofrimento. Portanto, nem a naturalidade nem a tradição justificam o especismo; elas podem, na verdade, ocultar sua injustiça.


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Fonte:  colecao-uma-jornada-pela-etica-animal-livro-1-discutindo-o-especismo-1.pdf
Este volume, parte da Coleção Uma Jornada pela Ética Animal: Do Básico ao Avançado, foca-se na discussão do especismo, que é a discriminação injusta contra espécies não-humanas. O autor, Luciano Carlos Cunha, doutor em Ética e Filosofia Política, analisa criticamente diversas tentativas de justificar a menor consideração moral dada aos animais não-humanos em comparação com os humanos. A obra explora argumentos que variam desde a importância da espécie em si, passando por características metafísicas ou capacidades cognitivas, até apelos à tradição, naturalidade da prática, autointeresse e a própria natureza da ética, refutando-os e defendendo uma igual consideração para todos os seres sencientes. O objetivo é desconstruir as bases do antropocentrismo e do especismo, evidenciando as falhas lógicas e éticas por trás dessas justificativas.
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